Idiossincrasias: Duodecimado

Antologia de Ficção Científica

Duodecimado é a segunda antologia de contos de ficção científica da série Idiossincrasias. A coletânea prossegue a organização original de textos independentes que cobrem temas fundamentais da sf universal, e uma vez mais, convida o leitor a pensar em como seus personagens reagem aos ambientes tendo ciência e tecnologia como pilares intelectuais. Em Duodecimado, os assuntos tratados em diferentes estilos narrativos buscam amplificar no leitor a suspensão da descrença, apresentando personagens e situações cuja conclusão reside na apreciação do inesperado. Em Duodecimado, os contos são exercícios de avaliação perspectiva.

Narrativa

Como nos demais livros da série, as narrativas partem de uma relação metalinguistica com o Prólogo, no qual uma investigação emergencial tem início, e o leitor, deve portar-se como testemunha de um esforço contra a dúvida. Há o dispositivo final, afinal? Ou seria a leitura apenas um teste de um teste? Resta-nos saber como.

Os doze botões estavam dispostos sobre a mesa, em arco, iluminados em expectativa de pressionamento. A sequência não era importante, desde que ao primeiro toque, os próximos fossem também acionados, casos contrário, disseram, todo o mecanismo iria pelos ares e levando-o junto para o desconhecido. Não acreditou. Era apenas um teste. Mas não havia o que fazer para refutar o convite à solução, desde que fora capturado e colocado naquele cômodo branco sem portas ou janelas. O som parecia vir da mesa, orientações em forma de lista, lembrando e lembrando o que deveria ser conferido nas horas seguintes. Leitura. Trechos de situações, algumas absurdas, outras profundas, mas todas recheadas de pistas que serviriam ao propósito superior de encontrar a fonte de uma explosão vindoura, caso falhasse.

A mesa era negra e os botões eram igualmente negros, mas emoldurados em luminosidade avermelhada, atentou ao conjunto, com uma fresta pela qual deveria receber lâminas plásticas com a codificação, que disseram, somente ele seria capaz de decifrar. Então seria isso, um poder singular e intransferível, o qual salvaria seus captores? Um teste. Pois bem, passaria no teste. Imitando por chacota a voz monocórdia que saia do aparelho, ergueu o dedo indicador acima da cabeça, considerando se poderia realmente escolher um botão ao acaso. Aleatoriedade impossível. Não poderia. Sabia que a decisão seria anterior, inconsciente, cabendo a posterioridade um discurso que justificasse isso ou aquilo. Não tinha escolha nem de escolher qual botão deveria apertar primeiro. Fechou os olhos e deixou a mão descer sobre um deles, o qual se acendeu como fogo eletrônico e fez sair da fresta uma lâmina, como antecipado pela voz.

Aguardou a lâmina ser ejetada em conclusão do procedimento, e erguendo-a contra o teto luminoso, leu. Atento aos detalhes, pois não poderia arcar com a dúvida de não saber o que seria feito de sua leitura, ao final...

Autor

Guilherme Xavier (Guix) é o especialista em jogos e ficção científica responsável pela iniciativa neolabore. Friburguense de 1978 e cidadão niteroiense honorário desde 1997, investiga e trabalha com experiências interativas e narrativas no emocionante hibridismo academia-mercado. Magnificamente casado, é o papai gamer de Gabix e Igor, os incríveis gêmeos com um ano terrestre de diferença. Quando perguntado sobre a vida, respondeu: "Bem, se fosse outro não seria eu... Penso, logo me preocupo."


7

"Olharam entre si e consultaram coisas por detrás de seus olhos vítreos. Pareciam agir seguindo planos decididos por outros que não presentes, como agenciados por fios invisíveis. Um dos assaltantes tomou a dianteira e colocou-se atrás de Pandora, obrigando-a abrir a sua caixa. Os outros fizeram fila. Ela pensou na senha, mas a caixa não se abriu de imediato. Percebendo que sua dona estava em perigo pela leitura de sua fisionomia, temperatura, gestual e acompanhamento, acionou silenciosos sistemas de segurança, que sem seu conhecimento de máquina, foram cancelados em algum ponto entre a antena de emissão e o cubo central de recepção. Para a caixa, a ordem foi dada. Mas para quem quer que (ou o que) fosse responsável pela segurança do condomínio, nada de grave acontecia que merecesse inspeção.
Pandora articulou poucas e angustiadas palavras de misericórdia que foram severamente censuradas pelas mulheres."

(Modelo B(12-12)CX-2, p. 150)

8

"Estou assumindo o caso agora e resolvemos transferir você para nossas instalações. Para sua segurança, não iremos informar a localização e seguirá para lá sedado. Para sua segurança também, não poderá ver o meu rosto, nem o de ninguém, pois achamos que de algum modo, seu sistema ocular também foi invadido. Isso explica nossa comunicação previamente por texto, agora ser somente por som, diferente do que vínhamos fazendo com Maskers... Pobre homem. Um grande amigo. E ao que parece, simpatizou contigo. Disse-me que você lhe lembrava do filho morto na Guerra.
Sim, sim. Testemunhas viram ele se jogar, relutante, contra um eletrobonde metropolitano. Sobrou pouca coisa. Foi invadido, garantiram.
Enquanto não encontrarmos uma forma de impedir o sinal, não podemos nos arriscar. Você é o único que sabe o que está acontecendo e sem sua ajuda, o assassino que todos chamam Titereteiro, está usando pessoas como ferramentas e outras, de modo bem pior, como armas."

(Hckrs?, p. 162-163)

10

"Os números pareceram mudar de posição e cores. Mas continuavam se mordendo e dançando, uns sobre os outros, para onde quer que eu os observasse. Podia ver todos eles ao mesmo tempo, o que é difícil de explicar, mas fácil de visualizar. A voz dentro de mim continuou:
- O plano superhiper é esse no qual você está agora. Você está dentro de si mesmo, conversando com sua essência/existência e acaba descobrindo coisas sobre o seu próprio Realitron que nem mesmo eu sei. E olhe que não há ninguém melhor do que eu para falar de você, não é mesmo? Enfim... É super, é hiper e ilimitado de plano superhiper para plano superhiper. Todos os assinantes do plano superhiper estão no mesmo plano, se é que me entende, simultaneamente partilhando todas as suas próprias experiências. Nesse caso, você é, ao mesmo tempo, vinte e duas mil duzentas e vinte e duas pessoas que estão agora tendo o mesmo susto que você em seus respectivos Realitrons.
- Porque esse número exato?
- Você sabe."

(Do Contrato de Fidelização, p. 217-218)